1373 visitas - Fonte: Tijolaço
Vivemos no império do jornalismo de escândalos e da fofoca, onde qualquer um, por motivos sabe-se lá quais, pode dizer o que quiser, desde que seja sobra “a-empreiteira-ajudou-o-amigo-do-sócio-do-filho-do-Lula” e isso será publicado furiosamente como manchete.
Ontem – veja o post anterior – foi “sei que era da família do Lula porque o porteiro me disse que era e o rapaz do outro apartamento também comentou”. Hoje é a incrível história do “material de construção” do sítio que seria usado por Lula, manchete da Folha.
A ex-dona (ex, não é mais, portanto) de uma modesta loja de materiais de construção, a Depósito Dias, que você vê aí na foto, diz que vendeu R$ 500 mil em material para a reforma do sítio. Como os pagamentos eram entre “R$ 75 mil a 90 mil por semana, em dinheiro vivo”, supõe-se que as vendas se deram em cerca de um mês e meio.
Não sei se o leitor já teve a experiência de construir um casa, eu já (toc,toc, toc) tive.
É impossível gastar este valor em uma loja de materiais básicos de construção como esta, neste prazo.
Qualquer empreiteiro de casinhas de veraneio sabe disso.
Quando você vai fazer uma obra de porte, compra “caminhão fechado” de areia, pedra, terra de emboço, telha. Não compra no retalhista e o atacadista entrega aonde for, porque o frete que lhe custa entregar na loja já está no preço. Não é como numa reforma de cozinha ou banheiro, em que você compra areia em sacos plásticos, por não ter como descarregar e estocar.
Não só isso: comprar aos retalhos atrasa a obra, sobretudo quando você tem muita mão-de-obra empregada: imagina todos os pedreiros e ajudantes parados porque a “moça da loja” não entregou os dois metros cúbicos de areia do concreto de hoje…
Aquilo em que você poderia gastar uma fortuna destas numa obra não parece ser nem de longe a especialidade do “Depósito Dias”: ferragens hidráulicas de luxo, cerâmicas de primeiríssima, pisos de madeira, granitos, vidros blindex, luminárias, boilers, etc. No caso de um sítio, acrescente cabeamento elétrico, postes, manilhamento de drenagem, cantaria (pedras) para muros de arrimo e madeirame de telhado (vigas, caibros, ripas)… Nada, de novo, no escopo do Depósito Dias, a não ser os cabos elétricos, e talvez, porque a isto se compra aos rolos e ocupam pouquíssimo espaço, vão na mala do carro.
Mas a dona da loja pode mostrar o que e quanto vendeu? Não, porque admite que o fez “sem registro fiscal”, isto é, sem nota. E o que teve nota foi “para várias empresas, mas para mim todas elas eram Odebrecht”. Ah, bom…
Não precisa de nota, não vem ao caso.
Como também não veio ao caso, para o repórter e para o jornal indagar o que foi comprado para se chegar a este valor astronômico.
Será que uma obra de reforma, tocada por duas das maiores empreiteiras do Brasil – Odebrecht, para a Folha e OAS, para a Veja – não tem um mestre de obras que faça a relação do material e alguém com um telefone para orçar, comprar e mandar entregar? Bom, faltou um quilo de pregos 17 x 27, 10 metros de tábua de pinho para a forma de uma viga, 20 sacos de cimento para não parar enquanto chegam os 200 da entrega semanal, apanha lá no Depósito Dias. Fora daí, qualquer um sabe que não é assim, quando se tem dinheiro – e vivo – para pagar compras. Aliás, os tais envelopes pardos com dinheiro para pagar pessoal são a forma que se faz em qualquer obra com pedreiros e ajudantes. Não é em cheque ou conta corrente porque a maioria nem tem isso. O amigo ou a amiga leitora já fez isso com qualquer profissional que faça um reparo ou uma obra em sua casa.
É evidente que isso não prova que a Odebrecht não pagou a obra, mas igualmente não prova que a pagou e, quando se acusa, é isso o que precisa ser feito: provar.
O ridículo, porém, é que a história não bate com a lógica.
Afinal, será que a Odebrecht chegou a ser uma das maiores construtoras do mundo, com filiais em dezenas de países, capaz de fazer estradas e barragens no meio de desertos e de selvas, comprando do Depósito Dias e sem ter uma subempreiteirazinha capaz de fazer quatro suítes e uma churrasqueira a seu pedido?
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