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O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso prestou um enorme desserviço ao bom debate público neste 2º turno ao afirmar que quem vota no PT é menos informado, e coincidentemente, pobre. Essa declaração acabou dando munição para a onda de ataques preconceituosos, que partem sobretudo de São Paulo, fortaleza tucana, contra o Nordeste, onde Dilma amealhou cerca de 70% dos votos no último domingo. Ataques que se voltam também contra os beneficiários do Bolsa Família, ainda que São Paulo seja o segundo estado com maior número de famílias em todo o Brasil que dependem do programa. Mas quem se importa? A imagem que está consolidada no senso comum é de que o BF é coisa do Nordeste e dos grotões, para usar termo de Reinaldo Azevedo, intelectual orgânico da direita brasileira.
Como estratégia política o petardo de FHC é eficiente: tem o potencial de abalar o moral do eleitor nordestino, que talvez tema ficar identificado, no restante do país, como alguém que vota sem convicção ou sem informação, mas apenas por interesse. E interesse em algo que para muitos brasileiros é tido como uma esmola, uma chaga moral que diria respeito a gente “que não quer trabalhar”. Que não nos deixe mentir as inúmeras mensagens compartilhadas nas redes sociais aos milhares batendo nesta tecla desde a noite de domingo passado. No entanto a fala de FHC sobre o eleitorado de Dilma é, também, uma aposta de risco. Se o país for crescentemente dividido, nos próximos dias de campanha, entre Norte e Nordeste versus Sul e Sudeste, ou numa guerra retórica de ricos versus pobres, tende a se dar melhor aquela opção política mais identificada com as classes populares. O que não é o caso do PSDB.
A estratégia de FHC e de seus seguidores, além de tudo, é contraditória. Afinal, Aécio Neves teve voto também entre beneficiários do programa, e entre gente pobre em geral, e não só no Nordeste, mas sobretudo fora dele. O caso da vitória consagradora do PSDB em São Paulo, fazendo barba, cabelo e bigode com Alckmin, Aécio, Serra e a maioria dos candidatos a deputado, é emblemático. Apenas com os votos de Higienópolis, Jardins e Morumbi, ou da elite sertaneja de Ribeirão Preto, Rio Preto e Araçatuba, o PSDB não teria tido um resultado tão espetacular, que inclusive quase varreu o PT do mapa político paulista. Milhões de pobres que moram em SP sufragaram os nomes de Aécio, Alckmin e Serra nas urnas. Mas a lógica tucana é peculiar: pobre quando vota no PT é menos informado. Mas quando vota no PSDB aí a coisa é diferente.
Wagner Iglecias é doutor em Sociologia e professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP.
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