Autonomia do Banco Central proposta por Marina não seria benéfica, dizem economistas

Portal Plantão Brasil
3/9/2014 01:51

Autonomia do Banco Central proposta por Marina não seria benéfica, dizem economistas

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POR SÉRGIO RODAS OLIVEIRA



A proposta da candidata à presidência da República Marina Silva de conceder autonomia formal, por lei, ao Banco Central (BC) não trará benefícios ao país, dizem economistas ouvidos pelo Terra Magazine.



De acordo com o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e ex-diretor de Políticas e Estudos Macroeconômicos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) João Sicsú, a independência do BC dificultaria a execução das políticas econômicas do governo.



“O que precisa, na verdade, é cada vez mais coordenação entre os órgãos do governo, incluindo o BC. Por exemplo: há uma política de contenção da inflação. Então, o que deve ser feito? Se há uma política de contenção da inflação porque a economia está superaquecida, o BC deve elevar a taxa de juros, mas o Ministério do Planejamento também deve orientar no sentido de reduzir gastos públicos. O BC independente pode tomar decisões de reduzir taxas de juros, e o Ministério do Planejamento ir em outra direção. O objetivo de controlar a inflação não deve ser o objetivo de uma organização independente, deve ser o objetivo de todo o governo, de todos os seus ministérios, instituições e entidades. Essa é uma proposta na contramão da história”, explica Sicsú.



O professor da UFRJ dá um exemplo de prejuízo que um banco central independente pode causar. Se a inflação está alta por causa da escassez de tomate, o governo pode combatê-la por meio de uma ação integrada entre o BC e os ministérios da Agricultura e da Fazenda. No entanto, se o BC for independente, ele irá simplesmente aumentar a taxa de juros, comprometendo toda a economia. Para Sicsú, essa medida contradiz a ideia de “governar em rede” na qual se baseia o partido ainda não oficializado de Marina.



O professor aposentado da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda no governo José Sarney Luiz Gonzaga Belluzzo cita um modelo de banco central que poderia balancear o controle monetário com as outras instâncias econômicas: o do Deutsche Bundesbank, da Alemanha.



“O Bundesbank estava ancorado na chamada economia social de mercado. Agora não tem mais Bundesbank, pois quem exerce esse papel é Banco Central Europeu (BCE). Isso fazia parte de um arranjo social, por que qual é a ideia do social de mercado? É que a economia está encravada na sociedade. O Bundesbank estava articulado com os protagonistas do processo econômico, ou seja, as grandes empresas e os sindicatos de trabalhadores. Então, ele só movia a taxa de juros depois que os agentes mostrassem uma disposição para acatar a disposição de fazer os seus acordos salariais e de preços etc. dentro das regras da estabilidade monetária”, conta Belluzzo. Ele também garante que, mesmo sem lei que assegure sua independência, o BC tem mais liberdade do que o seu equivalente dos EUA, o Federal Reserve System (FED).



O ex-diretor do BC e atual economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio, Carlos Thadeu de Freitas, concorda com Sicsú e Belluzzo que a autonomia formal da entidade não traria benefícios ao país, mas por outros motivos. Segundo ele, antes de debater essa questão, é preciso fazer uma reforma fiscal.



“Você tem que ter limites para o crescimento das despesas públicas, limites para o crescimento de despesas com custeio, limites para todas as despesas, para que você enxergue uma sustentabilidade à frente. Caso contrário, na atual política fiscal expansionista, se o BC só olhar para a meta de inflação, ele vai ter que subir muito os juros, e vai piorar ainda mais a situação fiscal e da dívida pública”, opina Freitas, que ainda diz que o BC hoje opera com autonomia, eficiência e transparência.



Modelo do BC e mandatos para presidente e diretores



Freitas afirma que também seria preciso definir o modelo de banco central que seria adotado no Brasil. Há dois principais tipos: o europeu (o BCE) e o norte-americano (o FED). O primeiro tem competências semelhantes às do brasileiro, focadas, principalmente, no combate à inflação. Já o segundo, além de zelar pela alta de preços, também se ocupa de promover o maior crescimento econômico possível. Dessa forma, o FED sempre balanceia as suas duas principais funções, de modo a tomar medidas equilibradas para ambas.



De acordo com a coordenadora do programa de governo de Marina Silva e acionista do Banco Itaú Maria Alice Setubal, a Neca, a proposta de Eduardo Campos de estabelecer mandatos para o presidente e diretores do BC será assumida pela candidata do PSB. Caso essa medida seja implantada, os comandantes da instituição continuariam a ser nomeados pelo presidente da República e sabatinados pelo Senado, mas o período de permanência no cargo não seria coincidente com o do chefe do Executivo. Além disso, eles não poderiam ser trocados no meio de seus mandatos.



Belluzzo concorda com essa mudança, desde que as sabatinas realizadas pelo Senado sejam levadas a sério: “Hoje elas são precárias, passa todo mundo”. O professor aposentado da Unicamp também diz que o BC somente terá autonomia de verdade quando deixar de incluir apenas dirigentes oriundos de instituições financeiras privadas em seus quadros.



Já Sicsú é crítico dessa proposta. Na sua visão, “a democracia fica enfraquecida” ao se determinar mandatos para os dirigentes do BC.



“Nós votamos para presidente da República, e ele tem que ter autonomia para governar. E uma das necessidades é colocar e tirar dos cargos quem tem bom ou mau desempenho. Não pode ter alguém que não seja eleito pelo voto que tenha força para enfrentar o presidente. Porque esse é o caso. O BC é um organismo muito poderoso, controla a taxa de juros, controla o crédito, faz regulação bancária, tem influência sobre a taxa de câmbio… e esses diretores e o presidente teriam mais força do que o presidente da República, que é eleito. Isso é inaceitável”, argumenta o professor da UFRJ.



Política econômica de Marina



Marina Silva é vista com ceticismo por alguns setores do empresariado. Isso se deve à sua intransigência na preservação do meio ambiente, à recusa em receber doações de companhias do agronegócio, de bebidas alcoólicas e cigarros e ao fato de quase não falar de economia em seus pronunciamentos, ao contrário do que Eduardo Campos vinha fazendo até morrer em um acidente aéreo em 13 de agosto.



Assim, a proposta de conceder autonomia formal ao BC seria uma tentativa de agradar o mercado, avalia Sicsú, “devido ao fato de essa ser uma medida que só interessa a ele, porque quando você afasta o BC do governo, ele é capturado pelo sistema financeiro”.



Belluzzo concorda com o ex-diretor do IPEA: “Ela não está falando com o cara que levanta às cinco horas da manhã e vai trabalhar”. E critica a pressão pela independência da instituição, algo imposto pela “ditadura das finanças”, segundo ele.



“Talvez fosse melhor fazer o seguinte: o povo do mercado elegeria o presidente do BC, e o presidente do BC elegeria o presidente da República”, ironiza o economista.



Já Freitas é pragmático ao prever a condução macroeconômica de um eventual governo Marina. Para ele, o primeiro ato de quem quer que ganhe as eleições terá que ser a realização de um aperto fiscal, além de manter a política monetária atual. “Não tem alternativa”, afirma.



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