Após medidas para segurar dólar, argentinos vivem clima de incerteza sobre economia

Portal Plantão Brasil
29/1/2014 09:44

Após medidas para segurar dólar, argentinos vivem clima de incerteza sobre economia

Novas regras para compra de dólares e possibilidade de inflação dividem a opinião pública;verno anunciou possíveis sanções

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1287 visitas - Fonte: Rede Brasil Atual

No segundo dia útil depois do anúncio das novas regras para a aquisição de dólares por pessoas físicas que desejam poupar em moeda estrangeira, a Argentina vive um clima de incertezas e espera sobre o futuro e as opiniões se dividem entre a indiferença, o pessimismo e a confiança em um 2014 com mais estabilidade.



A Administração Federal de Ingressos Públicos (Afip) – equivalente à Receita Federal brasileira – informou ontem (27) à tarde que realizou 235 operações, nas quais vendeu cerca de US$ 110 mil a pessoas físicas. O organismo informou também que recebeu 126 mil solicitações de compra de dólares para poupança no primeiro dia das novas regras, que equivaleriam a cerca de US$60 milhões.



Já o chefe de gabinete de Cristina Kirchner, Jorge Capitanich, anunciou na manhã de hoje (28), durante uma coletiva de imprensa, que o governo poderia punir comércios que aumentem de forma abusiva os preços em função da desvalorização do peso argentino.



Entre a indiferença e a preocupação

Enquanto varre uma calçada do bairro de Palermo, o porteiro Carlos Spinedi, de 61 anos, ri quando é perguntado sobre a flexibilização das regras para a compra de dólares. “Acho que é uma boa notícia, mas não tem nenhuma influência na minha vida.”



Spinedi está sindicalizado e espera que as negociações salariais coletivas (conhecidas como paritárias na Argentina), que começam em março, possam abrir um panorama mais certeiro sobre o futuro do país. “Acredito que o aumento salarial vai ser de mais de 25%, mas, por enquanto, não posso tirar conclusões sobre as medidas.”



Os acordos coletivos de salário serão fundamentais para a previsão da inflação argentina em 2014, já que se teme que eles possam pressionar o índice. O secretário geral da Confederação Geral do Trabalho (CGT) “opositora” e do grêmio dos caminhoneiros, Hugo Moyano – antigo aliado e agora ferrenho opositor ao governo de Cristina Kirchner –, adiantou que as paritárias serão tensas este ano e previu acordos de reajuste de até 30% para seu sindicato. Em entrevista à rádio La Red, Moyano disse ainda que outras associações poderiam pressionar por aumentos maiores.



Bernardo, um comerciante de 69 anos que não quis não revelar o sobrenome, acredita que as novas regras para compra de moeda estrangeira não serão cumpridas. “Ainda não há nada claro. O governo diz coisas e depois volta atrás. Hoje mesmo [segunda-feira], o dólar blue [como é conhecido o mercado paralelo] voltou a subir.”



Ele depende de produtos importados na loja que possui, uma ótica, e reclama das vendas e do aumento dos insumos. “Já me disseram que vai haver um aumento de 40% por conta da desvalorização do peso, que foi muito grande. Existe muita incerteza e, com isso, ninguém compra nada.” Ele acredita que os argentinos têm o hábito de poupar em dólares por conta da inflação, que segundo ele “sempre foi uma questão na Argentina”.



Desdém

Já Andrés Noblega, que, aos 39 anos é dono de um pequeno bar em Palermo, bairro de classe média alta, não se deixa abalar pelas expectativas de aumento na inflação e desdenha do dólar. “Não tenho o hábito de economizar em moeda nenhuma. Eu invisto para gerar novos negócios, por isso minha expectativa para 2014 é crescer.” Enquanto conversa com a reportagem de Opera Mundi, Andrés olha a tela do computador e diz que o arquivo aberto com as previsões para fevereiro o deixa otimista.



“Os argentinos gostam de especular e por isso apostam ao dólar. Quem joga com o dólar faz isso porque é miserável de alma, não de dinheiro. Não precisam comer, precisam acumular e certamente agora estão passando por um mau momento. Estão muito mais em conflito consigo mesmos que eu, com certeza”, diz com um sorriso de canto de boca.



O trabalhador autônomo e artista plástico Guillermo Mora, de 62 anos, segue a linha de Andrés. Para ele, que se diz “um autêntico representante da economia informal” e não se beneficia de acordos salariais “nem de aposentadoria, nem de férias, nem de nenhum direito trabalhista”, “hoje sequer há uma desvalorização se comparamos com outros momentos da história argentina.” Ele acredita que, assim como afirma o governo, o que houve foi um ajuste cambial “abaixo inclusive das expectativas de quem queria que o dólar chegasse a 13 pesos”.



Guillermo considera que o hábito argentino de poupar em dólares e a desconfiança com a moeda nacional foi gerada por sucessivas crises econômicas que o país enfrentou desde os anos 1970, mas critica a paixão pelo dólar. “A moeda nacional é um símbolo com o qual se retribui o valor do trabalho, ou seja, é muito importante. Eu guardo pesos no bolso porque sei que com eles eu compro, com eles me pagam. É uma tragédia cultural que uma sociedade não acredite na moeda que imprime seu próprio Banco Central. E também é o instrumento de pressão, porque é o calcanhar de Aquiles dos argentinos.”



Controle de preços

Com o chimarrão na mão, Guillermo não se alarma com a possibilidade de uma espiral de inflação. A erva mate é um dos alimentos da cesta básica argentina e faz parte da lista de produtos do programa Preços Cuidados, um acordo entre o governo e cadeias de supermercado para controlar preços de alguns itens de consumo diários dos argentinos.



“Podem me chamar de louco, mas tecnicamente não creio que se possa falar de uma inflação grave que comprometa a estabilidade. Existe, sim, uma pressão especulativa sobre os preços”, afirma o trabalhador autônomo. No entanto, ele acredita que é muito prematuro para fazer previsões sobre a economia em 2014. “Não sei se estou projetando meu próprio desejo, mas acho que vai haver estabilidade e isso depende da capacidade do governo de controlar os preços para que não disparem por pressões inflacionárias.”



Na contramão, Mercedes, uma professora de 35 anos que também não quis revelar o sobrenome, reclama dos aumentos em frente a um supermercado do bairro de Almagro. “Há muito tempo vemos os preços aumentarem. Não sei se meu poder de compra vai diminuir muito ou vai estar no limite”, imagina para 2014. Ela acha que as negociações salariais de março podem chegar a corrigir a defasagem entre renda e consumo porque “senão as aulas não vão começar” e isso pode pressionar a um bom reajuste para professores.



Para a professora, que leva seu filho de pouco mais de um ano em um carrinho de bebê, “a flexibilização nas normas para compra de dólares é uma mentira.” “Se deixam você comprar alguma é muito pouco, uns US$ 50. Pra comprar isso que enfiem... no bolso”, se controla.



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