Vereadora petista pode ser cassada por denunciar gestos nazistas, mas avisa que não vai se calar

Portal Plantão Brasil
3/2/2023 20:45

Vereadora petista pode ser cassada por denunciar gestos nazistas, mas avisa que não vai se calar

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17172 visitas - Fonte: DCM

A advogada e vereadora Maria Tereza Zanella Capra (PT), de São Miguel do Oeste, em Santa Catarina, está sendo vítima de um processo de cassação por ter repudiado gestos nazistas em um ato golpista realizado no município, no ano passado. Ela é acusada de ter “desrespeitado os manifestantes” e “difamado o povo migueolestino”. A votação na Câmara de Vereadores que pode cassar o seu mandato está marcada para sexta-feira (03).

O município, que tem cerca de 40 mil habitantes e fica no Extremo Oeste catarinense, virou notícia nacional no dia 02 de novembro de 2022, quando militantes de extrema-direita fizeram o gesto da saudação nazista “Sieg Heil”, em frente a uma base do Exército. O protesto tinha como pauta a não aceitação da vitória eleitoral do presidente Lula (PT) e pedia “intervenção” das Forças Armadas. Maria Tereza Capra, única vereadora petista da cidade, assim que tomou conhecimento do ocorrido, gravou um vídeo denunciando o fato e publicou em seu Instagram.

“Uma vergonha o que aconteceu aqui. São Miguel do Oeste sendo reconhecida nacionalmente como o lugar em que manifestantes que não reconhecem o resultado das urnas, porque perderam a eleição, trancam uma via importante para se manifestar contrário ao resultado democrático da eleição. Além de tudo, esses manifestantes fizeram uma saudação nazista, isso é repetir o maior drama que a população mundial já viu”, afirmou no vídeo e em nota publicada no mesmo dia.

“Nenhum deles tem o direito de fazer o que fizeram hoje e o que estão fazendo pelo país afora. Trancar as rodovias e fazer saudação nazista contra determinação legal constitucional, praticando crimes! Esperamos que o Ministério Público consiga concluir seu trabalho e que os responsáveis sejam punidos”.

“Quando eu vi os meus conterrâneos praticando equivocadamente atos como esse, achando que pedir intervenção militar é o caminho, querendo deslegitimar uma eleição, eu fiquei realmente tomada de uma indignação muito grande. E de perceber que justamente na minha cidade, onde alguns meses atrás a polícia tinha identificado artefatos nazistas em uma prisão realizada, na hora que vi o gesto na manifestação eu pensei ‘era só isso que faltava mesmo’”, diz ela ao DCM.

No dia seguinte ao ato golpista, vereadores que assumiram ter participado da manifestação, apresentaram uma moção de repúdio contra Capra. Extremistas que acompanhavam a sessão no parlamento municipal realizaram um protesto contra a parlamentar, chamando-a de “lixo” e gritando palavras de ordem “fora, Capra!”. Ela estava ausente da Câmara por uma questão de saúde.

A situação se agravou nos dias que se sucederam e os militantes de extrema-direita passaram a ameaçar a petista nas redes sociais: “Deus queira que eu não encontre ela na rua. Vou usar meu réu primário”, “Ela vai queimar no fogo do inferno… É uma petulância!”, “Não basta ser cassação, tem que ter eliminação”, foram algumas das mensagens recebidas, que constam em um boletim de ocorrência registrado pela vereadora. Ela também teve o seu carro riscado com palavrões e ameaças.

Por segurança, Maria Tereza Capra precisou deixar São Miguel do Oeste. “Eu tive que abandonar minha cidade, meu escritório, meu mandato, para me sentir segura. Isso é muito triste para mim, é muito dolorido”, afirma. Ela está desde novembro sem ir à Câmara de Vereadores e passou 80 dias em outra cidade.

Ainda em novembro, foram protocoladas duas denúncias na comissão de ética da Câmara Municipal de São Miguel do Oeste que pedem a cassação do mandato da parlamentar. A primeira delas, apresentada no dia 04/11, é assinada pelo advogado Brendo Luiz de Pizzol Barroso, que afirma que Capra “praticou infração político-administrativa grave, sujeita à apuração e sanção pela Câmara Municipal de Vereadores”.

De acordo com o documento, ao denunciar os gestos nazistas, a petista “atribuiu aos cidadãos de Santa Catarina e de São Miguel do Oeste o crime de fazer saudação nazista e ser berço de células neonazistas”. “O povo Migueolestino chora a dor de ter sido caluniado e difamado covardemente pela mídia nacional e internacional e pela ora Denunciada”, diz o texto. A denúncia afirma se tratar de uma “notícia falsa” o gesto nazista e que “as ações da Vereadora revelam uma clara afronta ao comportamento compatível com o decoro parlamentar”.

A segunda denúncia foi protocolada no dia 09/11, assinada por treze pessoas, entre elas policiais militares da reserva, corretores de imóveis e empresários. Nesse documento, os participantes dos atos golpistas alegam que o locutor da manifestação, um empresário local, pediu que os manifestantes estendessem a mão sobre o ombro da pessoa a frente ou, se não houvesse, para que estendessem o braço, a fim de “emanar energias positivas”. No entanto, a primeira explicação dos participantes, ainda no dia do ocorrido, tinha sido de que se tratava de uma “saudação à bandeira”, o que demonstra uma mudança de versão. A denúncia contra Capra diz, ainda, que por culpa dela a cidade de São Miguel do Oeste ficou conhecida como “terra de nazistas”.

Os pedidos de cassação foram acolhidos pela Comissão de Ética, que produziu um relatório favorável a acabar com o mandato de Maria Tereza Capra. Este relatório final ainda precisa ser votado pelos vereadores em plenário, o que acontecerá nesta sexta-feira (03). A Câmara de São Miguel do Oeste é composta por 13 parlamentares, sendo que dois deles foram apontados em um relatório da Polícia Civil como sendo líderes locais de manifestações golpistas. A expectativa para a votação é de que a cassação se concretizará.

“Tenho uma esperança de que não seja aprovado (o relatório). Mas a esperança é mínima, porque é um julgamento político, é um tribunal de exceção. São 11 vereadores que repudiaram minha atitude, que pediram a cassação em plenário e que estarão lá amanhã para votar”, afirmou a vereadora em entrevista para o DCMTV.

Maria Tereza Capra disse ter ficado emocionalmente muito abalada quando recebeu os xingamentos e ameaças, mas que já está se recuperando: “Foi triste receber, por conta do vídeo que eu postei, críticas e ofensas de amigas de infância com quem eu não falava há mais de 20 anos”. Ela relata que precisou fazer um caminho alternativo quando decidiu deixar o município, ainda no início de novembro: “De todas as coisas que aconteceram, (uma das mais dolorosas) foi a saída que a gente fez no dia 06 de novembro, que tivemos que ir por outro caminho sem ser o trevo principal da cidade, porque eles (os bolsonaristas) estavam lá”.

“Demorei muito para poder falar. Estava até um pouco traumatizada com vídeos, mas agora que me recuperei tenho essa condição de responder sobre isso. O silêncio é o maior inimigo nesse caso. É preciso denunciar. Vivemos uma onda mundial de ressurgimento do fascismo e do neonazismo, então precisamos nos contrapor a isso. Um grande passo estamos dando recuperando o governo federal”.

Na entrevista, ela também comentou a questão da violência política de gênero e a influência do fato de ser mulher nas agressões que está sofrendo: “Não tenho dúvidas de que se eu fosse um homem o tratamento seria diferente. Somado ao fato de que outras tantas vereadoras de esquerda foram perseguidas… Estudando sobre o fascismo, a gente sabe qual é a posição deles sobre as mulheres. Então há todo um contexto que nos faz temer pela nossa vida, também pela condição de mulher”.

Capra lamenta a atual conjuntura do seu município e de Santa Catarina e cita a antropóloga e pesquisadora Adriana Dias: “Em São Miguel do Oeste nunca houve uma situação como essa. Nós nunca tivemos uma manifestação desse cunho. Como Adriana Dias falava, o nazismo está em todos os lugares. Ás vezes ele aflora, mas tem muita gente que tem essa prática”.

“Temos que lutar. Santa Catarina já teve sinais de uma posição um pouco mais progressista. Eu sou uma pessoa que acredita, eu tenho fé, confiança de que podemos fazer. A gente não pode se conformar. Precisamos avançar, investir em educação, conversar com os filhos. Isso é um grande desafio, mas precisamos ser firmes nas nossas convicções. Mesmo se eu for cassada, não vou me calar”, disse Maria Tereza Capra ao DCM.

Confira abaixo a entrevista do DCM TV com a vereadora:




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