Ex-ministros da Justiça fazem Carta Aberta pelo controle de armas e pela democracia

Portal Plantão Brasil
7/4/2021 11:52

Ex-ministros da Justiça fazem Carta Aberta pelo controle de armas e pela democracia

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984 visitas - Fonte: O Globo

Há pouco menos de dois anos, manifestamos nossa profunda preocupação com os retrocessos no controle de armas e munições inaugurados pelo governo federal pouco tempo depois de sua posse.



Desde a publicação de nossa carta aberta, em 4 de junho de 2019, foram mais 9 decretos e 15 portarias do Exército Brasileiro ou de ministérios, em um conjunto normativo de 31 atos unilaterais do Poder Executivo que ferem de morte qualquer vislumbre de uma política de controle de armas e munições moderna e responsável, inclusive contradizendo acordos internacionais ratificados pelo Congresso e interiorizados no ordenamento jurídico nacional.







Nesse período, discursos que elevam o armamento da população como instrumento de ação política, orientada contra adversários e contra políticas das quais se discorde, foram irresponsavelmente apontados como caminho para o fortalecimento da democracia brasileira. Além de irem na contramão das prioridades de um país assolado por uma das maiores crises sanitárias de sua história, as medidas adotadas pelo governo federal ignoram todas as evidências científicas sobre o impacto negativo do aumento do acesso e circulação desses arsenais num país já gravemente afetado pela violência armada: cerca de 70% dos homicídios que acontecem no Brasil são cometidos com armas de fogo.



De acordo com dados da Polícia Federal e do Exército, houve um aumento de 65% no acervo de armas registradas nas mãos de civis no Brasil entre 2018 e 2020. Depois de adotar uma série de medidas que aumentaram o acesso a grandes quantidades de armas e munições pela população, o governo publicou quatro decretos que reduziam o controle estatal sobre esses arsenais.







Como reforçamos em nosso último posicionamento, a consolidação da regulação responsável de armas e munições de um país é uma ação de longo prazo, e precisamos orientar nossas políticas públicas para superar os desafios ainda presentes, em estreita colaboração com governadores e com quadros técnicos que se dedicam ao enfrentamento do tráfico ilegal de armas e munições e à redução da violência armada no país. Não há espaço para retrocessos.



Diante do luto das mais de 330 mil mortes em razão da pandemia, é preciso que a garantia ao direito à vida e à segurança da população seja a prioridade máxima da ação dos Poderes da República.



É nesse contexto que, novamente, alertamos para os riscos do conjunto normativo apresentado pelo presidente da República para flexibilizar o acesso a armas e munições e reduzir o controle estatal sobre esses arsenais, ao contrário do que prevê a legislação em vigor. O Supremo Tribunal Federal e o Congresso Nacional precisam agir, com urgência, para barrar as medidas do descontrole armado adotadas ao longo dos últimos dois anos e para impedir que os decretos publicados em fevereiro entrem em vigor no próximo dia 12. Armar a população não é o caminho para um país mais seguro e menos desigual, tampouco para o fortalecimento de nossa democracia. Que se determine a ilegalidade desses decretos e que sejam revogados.



Aloysio Nunes Ferreira, Eugênio Aragão, José Carlos Dias, José Eduardo Cardozo, José Gregori, Miguel Reale Jr., Milton Seligman, Raul Jungmann, Tarso Genro e Torquato Jardim, ex-ministros da Justiça







NOTA DO PLANTÃO BRASIL



Leia na íntegra a Carta Aberta ao presidente Bolsonaro:



04 de Junho, 2019 - 09:30 ( Brasília )

Desarmamento - Carta aberta pelo controle de armas

Ampliar acesso não é solução para garantir segurança



Aloysio Nunes Ferreira

Eugênio Aragão

José Carlos Dias

José Eduardo Cardozo

José Gregori

Luiz Paulo Barreto

Miguel Reale Jr.

Milton Seligman

Raul Jungmann

Tarso Genro

Torquato Jardim



Nós, ex-ministros da Justiça e da Segurança Pública, que em diferentes momentos da história fomos responsáveis por conduzir a política de segurança pública no âmbito federal, demonstramos nossa profunda preocupação com os retrocessos no controle de armas e munições e com o impacto dos decretos federais no desmantelamento dos principais pilares desta agenda.



A efetividade das políticas públicas depende de sua continuidade, monitoramento e avaliação constantes para que possamos aperfeiçoá-las e dar respostas a seus novos desafios. O controle de armas e munições no Brasil é uma agenda central para o enfrentamento do crime organizado e para a redução dos homicídios. Por essas razões, seus ganhos não podem ser colocados em risco. Precisamos trabalhar para o seu fortalecimento, impedindo retrocessos.



No período em que exercemos nossas funções de ministro, cada um de nós trabalhou para que fosse estabelecida no país uma política de regulação responsável de armas e munições. Em 2003, o Congresso aprovou o Estatuto do Desarmamento, um importante passo nesta trajetória. Resultado de mobilização entre diferentes partidos, organizações da sociedade civil e lideranças de diversos setores da sociedade, além de quase um ano de debates no Congresso, o estatuto definiu alguns dos pilares centrais desta regulação: proibição do porte civil, restrições à posse e o estabelecimento de mecanismos de controle de produção, circulação e comercialização de armas e munições.







Atuamos para fortalecer as capacidades nacionais de controle e fiscalização, reduzindo as armas em circulação. Também trabalhamos para enfrentar desvios e o tráfico de armas e munições. Resistimos às pressões de grupos no Congresso e de categorias que buscavam flexibilizar as condições da posse e as restrições ao porte de arma de fogo.



Independentemente dos partidos que estavam no poder e da orientação dos governos dos quais fazíamos parte, nosso compromisso sempre foi o de fortalecer avanços que consolidassem o Brasil como uma referência de regulação responsável de armas e munições para a América Latina e para o mundo.



Conquistamos avanços importantíssimos, incluindo a queda da taxa de crescimento de homicídios nos primeiros anos da legislação em vigor e a desaceleração no crescimento de mortes por armas de fogo nos anos posteriores. De acordo com o Mapa da Violência, na década seguinte à sua aprovação, o Estatuto do Desarmamento ajudou a salvar a vida de cerca de 133 mil brasileiros. Apesar desses avanços, agora se articula o desmantelamento de uma lei largamente discutida, democraticamente votada e universalmente executada por diferentes governos.







A consolidação de uma regulação responsável de armas e munições no país é uma ação de longo prazo e é preciso orientar todos os esforços para superar os desafios com os quais ainda somos confrontados. Tais esforços precisam ser feitos em contínua colaboração com os estados e quadros técnicos e profissionais que se dedicam ao enfrentamento dos desvios e tráfico ilegal de armas e munições, à redução da criminalidade e à prevenção da violência no país.



Neste sentido, precisamos aperfeiçoar, por exemplo, os mecanismos de marcação de armas e munições e a qualidade das informações necessárias para permitir o rastreamento de armas desviadas para a ilegalidade e utilizadas na criminalidade, o que contribuirá para o esclarecimento de delitos.



Como ex-ministros e cidadãos, estamos convencidos de que ampliar o acesso às armas e o número de cidadãos armados nas ruas, propostas centrais dos decretos publicados pelo Executivo federal, não é a solução para a garantia de nossa segurança, de nosso desenvolvimento e de nossa democracia.







Ao invés de flexibilizar os principais pilares do controle de armas e munições de nosso país, precisamos proteger o legado das conquistas que protagonizamos e concentrar nossos esforços na função primordial do Estado: garantir o direito à vida e a segurança para todos.



Aloysio Nunes Ferreira

Ex-ministro da Justiça (2001-2002, governo FHC)



Eugênio Aragão

Ex-ministro da Justiça (mar. a mai.2016, governo Dilma)



José Carlos Dias

Ex-ministro da Justiça (1999-2000, governo FHC)



José Eduardo Cardozo

Ex-ministro da Justiça (2011-2016, governo Dilma)



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