718 visitas - Fonte: O Globo
No dia em que Jair Bolsonaro deu posse a seis novos ministros, o fato de a indicação do novo Diretor Geral da Polícia Federal ter sido mais comentada do que o discurso do novo ministro da Justiça diz muito sobre o estado de coisas no governo.
A escolha do subordinado chamou mais atenção do que os planos do novo ministro porque é dele que podem vir as surpresas. Anderson Torres, o novo titular da Justiça, é bolsonarista de carteirinha e não foi nomeado para inventar moda. Será subserviente como o presidente espera. Sua fala na posse, reforçando a dicotomia entre economia e saúde, no dia em que se registraram mais de 4 mil mortes pela Covid-19, só confirma isso.
O mesmo não se espera de Paulo Maiurino, o novo DG (como é chamado o chefe da PF na corporação). Seu maior ativo como diretor-geral não está na relação com o bolsonarismo ou com a família presidencial, mas sim no fato de ser um "delegado-político" com ótimo trânsito no Judiciário.
Embora seja próximo, sim, de Anderson Torres, com quem convive há anos em Brasília, Maiurino não é bolsonarista raiz e nem tem laços com a família presidencial. O novo DG e o novo ministro têm em comum o fato de serem politicamente articulados.
Mas se no caso de Torres isso significa alinhamento automático, no caso de Maiurino pode fazê-lo mais independente do que o presidente gostaria. Maiurino foi secretário de estado de Geraldo Alckmin em São Paulo e conselheiro de segurança do governo de Wilson Witzel, além de corregedor do ministério da Justiça nos governos de Lula e Dilma Rousseff.
No ano passado, quando ele esteve entre os cotados para dirigir a Polícia Federal, seu nome não pareceu o mais adequado a Bolsonaro.
Na época, o também delegado Alexandre Ramagem era um personagem em alta no Palácio do Planalto. Para nomeá-lo diretor da PF, Bolsonaro demitiu Sérgio Moro do ministério da Justiça e bancou uma crise com o Supremo.
Não conseguiu colocar Ramagem onde queria, mas o manteve na Abin. Na PF, pôs alguém que o próprio Ramagem escolheu – Rolando de Souza, mais jovem e mais inexpressivo do que Maiurino. Mas que, ainda assim, atravessou os últimos meses sem provocar marolas políticas e nem sacrificar o nome da PF.
Quem se envolveu em rolos depois disso foi o próprio Ramagem. Um deles foi a revelação, pela revista Época, de que a Abin fez relatórios orientando a defesa de Flávio Bolsonaro sobre como agir para obter informações sobre fiscais da Receita que o investigaram no caso das rachadinhas da Alerj, pagas por Fabrício Queiroz.
O espaço para arapongagens baratas, agora, está reduzido. Bolsonaro precisa mais do que nunca da da boa vontade do Supremo. A corte tem sob sua responsabilidade, entre outros assuntos espinhosos, o inquérito das fake news e o um pedido para ordenar a abertura da CPI da Covid no Congresso.
Na última crise com as Forças Armadas, eram os próprios militares a sugerir, nos bastidores, que qualquer tentativa de golpe por parte do presidente deveria ser contida pelo Supremo. Na atual conjuntura, vale mais a Bolsonaro ter alguém que possa construir pontes com o Judiciário do que queimá-las.
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"Delegado-político", Maiurino pode vir a ser essa figura. Nos últimos dois anos, Paulo Maiurino foi secretário de Segurança de José Dias Toffoli na presidência do STF e assessor do ministro do STJ Humberto Martins no Conselho Nacional da Justiça Federal. Além disso, é filho de um coronel da PM e bem relacionado entre militares.
Justamente por esse perfil, seus futuros subordinados na PF estavam ressabiados – "ele é afável, mas está há muito tempo longe do dia-a-dia", me disse um delegado em cargo de chefia.
Quem o conhece bem, porém, diz que Maiurino dificilmente vai se queimar em nome de Bolsonaro. "Ao contrário de Torres, que é menor do que o cargo que ocupa, ele construiu uma carreira de respeito e não vai fazer loucura para se provar. Maiurino já conhece todo mundo que interessa", afirma um amigo muito próximo.
Um sinal disso é a provável nomeação de Luiz Flavio Zampronha, que já investigou o mensalão tucano e os hackers da Lava Jato, para a área de combate à corrupção.
A se confirmar o diagnóstico do amigo, os limites do novo diretor-geral da PF para tentativas de interferência vindas de cima, em futuras crises, podem acabar se mostrando estreitos demais para o presidente – mesmo com Anderson Torres no ministério.
Não é um prospecto muito animador para Bolsonaro, mas é o que ele tem à disposição para o momento.
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